miércoles, 3 de junio de 2009

SUBSIDIOS PARA A HISTORIA DA GUERRA DE ANGOLA

O DESEMBARQUE DOS MÍSSEIS SCUD EM MOÇÂMEDES

Entre Agosto e Setembro de 1979, desembarcam em Moçâmedes mísseis SCUD de fabicação Sovietica.
Uma semana depois, aviões sul-africanos bombardeiam algumas posições militares perto do porto de Moçâmedes além da estrada e caminho de ferro, que une este porto com a cidade da Huila, mas o certo é que os mísseis já haviam passado para o planalto da Huila, para zona que desconheço.

Como se procedeu a esse desembarque:

Estando naquele porto como Piloto da Barra, certo dia que não posso precisar, mas que terá ocurrido entre Agosto e Stembro de 1979, sou visitado nas instalações da Capitania do Porto, por oficiais cubanos, que avisão a mim e ao piloto assistente que estava em práticas nesse porto, baixo a minha supervisão, de que deviamos proceder, a meia tarde, a retirar a todos os navios que estavam atracados ou nas cercanias do porto, e que os deviamos levar para o porto do Giraul, afastado cerca de tres milhas maritimas, e alí fundear-los, com ordens de que deveriam permanecer essa noite com as luzes apagadas. Creio que havia dois navios de bandeira Grega e um português, além de outros dois, que creio de bandeira de Panama.
Assim que cumprimos essas ordens, voltámos à Capitania, e fomos informados de que permaneceriamos militarizados até nova ordem, e que deveriamos acompanhar aos oficiais cubanos pelo resto da tarde e noite. Entretanto foi dada ordem de recolher obrigatório para a cidade, a partir das nove da noite e a luz foi cortada, ficando a cidade completamente ás escuras.
Sobre as dez da noite somos levados ao porto e durante o trajecto nos indicam que iremos a proceder a atracar um navio mercante e que toda esta operação se deve manter no mais rigoroso secreto. Embarcamos na lancha de Pilotos e avançamos para o meio da baia, com a unica referencia da pouca luz da lua, e sobre as doze da noite avistamos uma luz de lanterna em direcção do mar alto, á qual nos dirigimos. Durante todo este tempo estamos acompanhados por um oficial cubano.
O navio que nos espera è um roll-on-roll-off, ou um portacontentores com rampa de pôpa, sovietico. Procedemos de imediato a atracar o Kapitan... e logo depois de atracado o navio, nos indicam que devemos permanecer a bordo para que logo de terminada a descarga se proceder a desatracar-lo. Também nos indicam, que não deveremos aproximarnos das vigias e janelas, que mantém as cortinas cerradas, nem sair da cabine/ salão do Comandante do navio.
Entretanto subem a bordo alguns oficiais superiores cubanos, creio que entre eles o General Ochoa, e o Comandante em Chefe do exercito angolano para o sul de Angola, o Comandante "Gato".
Para melhor passar aquelas horas em que estão a descarregar o navio, somos brindados com alguns acepipes e nos dão algo de comer, enquanto nos servem ou cerveja alemã ou vodka sovietico e mesmo run cubano.
Em detrminado momento devo ir ao banho e, levado pela curiosidade, aproveito para espreitar pela vigia do banho, que estava meio aberta, e fico estupfacto pela visão de enormes camiões rusos, com um carregamento muito especial: Os enormes SCUD sovieticos, estavam a ser desembarcados pela primeira vez em Angola. Os pensamentos são desencontrados e, se o medo de conhecer o segredo daquela operação me assalta a mente, os sentimentos de orgulho patriotico também me assaltam, e com certo optimismo, penso que a arrogancia do regime sul-africano, que impunemente invadia e bombardiava Angola, a partir daquele momento teria que pensar se continuar ou não com as suas acções...
Sobre as quatro da manhâ terminava aquela missão secreta, e depois da manobra de desatraque, pudémos regressar a casa e descançar. Durante largos anos, mantive o segredo mais absoluto sobre esta operação mesmo depois de ter saido de Angola, o que aconteceu poucos meses depois daquela missão.
Poucos dias depois, em casa de alguns amigos cubanos, (o mecânico Sala e o oficial cubano de ligação portuária Rabaças), logo de ter vencido por 1ª vez uma partida de xadres ao Sala, que era campeão da sua cidade, dou um salto de alegria e sufro um pequeno accidente e parto um dedo do pé dtº...
Entro de baixa médica e vou descançar para a casa dos meus pais no Lobito, e logo me desloco a Luanda tentando conseguir autorização para ir de férias a Portugal, onde viviam a minha mulher e filhos, dos quais não conhecia o segundo, por ter nascido em Portugal e porque não tinha conseguido até então autorização para sair de Angola, devido a que então era considerado um trabalhador indispensável para aqueles momentos do País. Várias exposições feitas ao Ministro de Transportes, tiveram como despacho aquela cconsideração. Guardo ainda hoje cópoia desses documentos.
Volto ao porto de Moçâmedes alguns dias depois, para revisão médica, e para tal me facilitam embarcar como passageiro a bordo de um Ilushin sovietico, onde encontrei uns quantos reporteiros de diversos meios de comunicação, tanto de Angola como de paises da órbita sovietica, entre os quais um, que anos antes nos tinha entrevistado no porto de Luanda, quando estavamos em praticas para Pilotos de Barra, (de uma televisão russa), e que iria sobrevoar e filmar os estragos dos bombardeios sul-africanos, que entretanto tiveram conhecimento de que armamento pessado havia sido desembarcado naquele porto do sul de Angola. Sobrevoámos a estrada da Leba, parcialmente destruida, as pontes do caminho de ferro, também destruidas e as instalações militares perto do porto de Moçâmesdes que também haviam sido destruidas. Logo aterrizamos em Moçâmedes onde, depois da revisão médica, sou impedido de volttar ao Lobito, apesar de estar de baixa médica.
Com o pretexto de que era uma peça chave para a economia do País, estive práticamente com residência vigiada, durante a minha estadia de quase nove meses em Moçâmedes, impedido de poder sair da cidade e inclusivé de visitar a vizinha cidade da Huila e mesmo de ir passar o fim de samana a praias cercanas á cidade de Moçâmesdes. Quando me acercava á saida da cidade, alí estava o militar de guarda que me pedia o salvo-conduto especial, que deveria aportar se pretendesse sair da cidade, caso que únicamente se aplicava a mim... Assim era de duro a vida naquela altura em Angola.
Também por isso, resolvi não regressar a Angola depois do periodo de férias em Portugal, que finalmente consegui em Novembro de 79...
Anos mais tarde soube, segundo declarações de um oficial cubano, que a inteligencia militar sovietica tinha detectado que os sul africanos estavam a ponto de conseguir a bomba atómica, e que a inteligencia cubana, informada de essa posibilidade, teria conseguido um acordo com os sovieticos para meter em Angola uma arma dissuasória que ameaçasse retaliar qualquer intervenção sul africana de tal envergadura. Isto justifica o envio dos SCUD para aquele tearto de guerra. Caso os sul africanos bombardeassem Luanda ou outra cidade importante, a retaliação chegaria com o bombardeamento de cidades sul africanas, e para isso, só os SCUD serviriam.

Claro está que para o teatro de guerra no interior de Angola, o uso dos SCUD não serviriam. Ao ser um missil de alcance médio, colocados algures no sul de Angola, poderiam alvejar qualquer cidade sul africana. Desconheço se algum SCUD teria sido desembarcado em Luanda, mas estratégicamente a sua utilização serviria apenas para alvejar o interior da Africa do Sul. Também desconheço se alguma vez se chegou a lançar algum SCUD como aviso aos mandos militares e civis da África do Sul.-

Telde,17 de Maio de 2009

Fernando Toulson L.Velho